"acho que Emerson escreveu algures que uma biblioteca é uma espécie de caverna mágica cheia de mortos. e esses mortos podem renascer, podem voltar à vida quando abrimos as suas páginas." [BORGES, Jorge Luis in Este ofício de poeta]
Sexta-feira, 15 de Novembro de 2013
Autor da semana: Don DeLillo

 

Don DeLillo nasceu em 1936, em Nova Iorque. É autor de vários romances e peças de teatro. Foi galardoado com o National Book Award, o PEN/Faulkner Award e o Jerusalem Prize. Submundo foi finalista dos prémios Pulitzer e do National Book Award e recebeu em 2000 a Medalha Howells da American Academy of Arts and Letters pela mais eminente obra de ficção dos últimos cinco anos; em 2006, foi considerado um dos três melhores romances dos últimos vinte e cinco anos pela New York Times Book Review. [wook.pt]

 

Don DeLillo ainda se inquieta com aquela manhã em Dallas

 

 

Durante os três anos que demorou a escrever Libra, a biografia ficcionada de Lee Harvey Oswald, Don DeLillo teve uma fotografia do assassino de John F. Kennedy a segurar numa espingarda em cima da secretária - a mesma que figura na capa da primeira edição norte-americana, de 1988. Quando terminou o romance, a moldura caiu ao chão, naquilo que o autor descreveu como uma "anti-epifania".

Na conversa que teve anteontem em Lisboa, DeLillo não revelou se acredita ou não se Oswald terá sido mesmo o autor do disparo mortal, se terá havido um segundo (ou terceiro) assassino ou qual é a sua conspiração favorita. Ficou-se pela imaginação.

Em Lisboa para integrar o júri do Lisbon & Estoril Film Festival, DeLillo aproveitou para apresentar a edição portuguesa de Libra (Sextante Editora), quando se assinalam 50 anos daquela manhã de 22 de Novembro em Dallas, em que "tudo pareceu parar". Foi um homem reservado, de expressão iminentemente séria ("Só sorrio quando estou sozinho", chegou a dizer ao New York Times), como é habitualmente definido, que subiu ao palco do Cinema Nimas e leu passagens de Submundo (1997, Sextante Editora), enquanto, na tela, corriam as imagens infames capturadas pela câmara Bell&Howell de Abraham Zapruder.

Os fotogramas sucedem-se, voltando atrás, repetindo, ampliando, sempre sem som, como que a acentuar a crueza do cenário. Ao mesmo tempo, DeLillo lia pausadamente a passagem em que duas personagens se encontram para assistir a uma projecção ilegal do filme de Zapruder, num armazém de Nova Iorque nos anos 1970. Quando termina a leitura, o filme ainda corre por alguns minutos, agora sim, num silêncio sepulcral. DeLillo fica a olhar para as imagens, "tão perfeitas a ser aquilo que são", esmagado pela grandeza que a tela lhes confere.

No dia do homicídio de Kennedy, DeLillo tinha acabado de fazer 27 anos - nasceu a 20 de Novembro - e soube de imediato que "algo sério e importante acabara". "De repente tínhamos um presidente fotogénico e popular e em segundos estava morto", contou, durante a conversa que teve com o seu tradutor Paulo Faria (autor da entrevista ao suplemento Ípsilon que será publicada amanhã), depois da exibição do filme de Zapruder. Aqueles segundos, frios e cruéis como bem mostram os fotogramas, lançaram "uma nuvem de paranóia sobre o país". DeLillo relembra que dias depois da morte de Kennedy teve de apanhar um avião. Quando já se encontrava no aparelho, começou a sair fumo do motor, ao que o piloto bradou sem hesitar: "Este avião não vai para lado nenhum hoje!" "Parecia estar em todo o lado", observou DeLillo.

Ainda longe de iniciar a sua carreira literária, DeLillo consegue reconhecer a importância que a morte de Kennedy teve para a sua obra, apesar de só dali a 25 anos vir a escrever Libra. "Não acho que os meus livros pudessem ter sido escritos no mundo que existia antes do assassinato de Kennedy", revelou em 1991 numa entrevista ao New York Times. "E penso que alguma da escuridão do meu trabalho é um resultado directo da confusão e do caos psíquico e do sentimento de aleatoriedade que se seguiram àquele momento em Dallas. É possível que tudo isto tenha feito de mim o escritor que sou, para melhor ou para pior."

Libra - título inspirado no signo astrológico de Oswald -começou a ganhar forma na cabeça de DeLillo quando descobriu que Lee Harvey Oswald chegou a morar a alguns quarteirões da sua própria casa, no Bronx. "Pensei se não o teria já visto alguma vez", conta. Estabeleceu-se então uma estranha empatia entre o escritor e a personagem ficcionada. DeLillo insiste que o livro é ficção e que não pretende apresentar factos ou responder às grandes questões levantadas pelas várias teorias da conspiração. É óbvio que o autor teve de se munir de material factual para a construção da vida de Oswald. Esteve várias vezes em Dallas, fez o percurso entre Dealey Plaza e o local de onde o assassino terá disparado e consultou o relatório da Comissão Warren, encarregada de investigar o homicídio. Mas é com uma desarmante honestidade que admite a sua ignorância sobre o assunto: "O Paulo [Faria] sabe mais do assassinato do que eu!"

No fundo, DeLillo é mais um entre os milhões de americanos para quem a explicação oficial - a de que Lee Harvey Oswald foi o lonely gunman, o assassino solitário, que matou o presidente Kennedy - não é suficiente. A forma que encontrou para expressar a sua inquietação foi aquela que melhor conhece e que revela na primeira frase da "Nota de Autor", presente no final da edição norte-americana de Libra: "Este é um trabalho da imaginação." [publico.pt]

 

Títulos, deste autor, disponíveis na biblioteca municipal.

 



publicado por bibliotecadafeira às 16:58
link do post | comentar | favorito

a biblioteca na Internet
homepage
catálogo
catálogo rcbe
facebook
contactos
mais sobre mim
pesquisar
 
Fevereiro 2014
Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab

1

2
3
4
5
6
7
8

9
11
12
13
14
15

16
17
18
19
20
21
22

23
24
25
26
27
28


posts recentes

Caros (as) leitores (as),

Autor da semana: Miguel M...

Estreias - cinema

Na mesa dos poetas

Sugestão de leituras

Músico da semana: Eric Cl...

Autor da semana: Flávio C...

Estreias - cinema

Na mesa dos poetas

Sugestão de leituras

Autor da semana: Afonso C...

Estreias - cinema

Juan Gelman: 1930 - 2014

Sugestão de leituras

Músico da semana: Bruce S...

Autor da semana: Gastão C...

Estreias - cinema

Na mesa dos poetas

Sugestão de leituras

Músico da semana: Juana M...

Autor da semana: Mário Za...

Estreias - cinema

Músico da semana: Anna Ca...

Autor da semana: José Ben...

Aviso

Músico da semana: Gisela ...

Autor da semana: Maria Ve...

Estreias - cinema

Na mesa dos poetas

Sugestão de leituras

tags

todas as tags

arquivos

Fevereiro 2014

Janeiro 2014

Dezembro 2013

Novembro 2013

Outubro 2013

Setembro 2013

Agosto 2013

Julho 2013

Junho 2013

Maio 2013

Abril 2013

Março 2013

Fevereiro 2013

Janeiro 2013

Dezembro 2012

Novembro 2012

Outubro 2012

Setembro 2012

Agosto 2012

Julho 2012

Junho 2012

Maio 2012

Abril 2012

Março 2012

Fevereiro 2012

Janeiro 2012

Dezembro 2011

Novembro 2011

Outubro 2011

Setembro 2011

Agosto 2011

Julho 2011

Junho 2011

Maio 2011

Abril 2011

Março 2011

Fevereiro 2011

Janeiro 2011

Dezembro 2010

Novembro 2010

Outubro 2010

Setembro 2010

Agosto 2010

Julho 2010

Junho 2010

Maio 2010

Abril 2010

Março 2010

Fevereiro 2010

Janeiro 2010

Dezembro 2009

Novembro 2009

Outubro 2009

Setembro 2009

Agosto 2009

Julho 2009

Junho 2009

Maio 2009

Abril 2009

Março 2009

Fevereiro 2009

Janeiro 2009

Dezembro 2008

Novembro 2008

Outubro 2008

links
subscrever feeds