Paulo José Miranda, poeta, ficcionista e dramaturgo. Licenciado em Filosofia pela Faculdade de Letras de Lisboa, publicou o seu primeiro livro em1997, Avoz que nos trai (poesia), com que ganhou o prémio de poesia Teixeira de Pascoaes. É membro do Pen Clube desde 1998. Obteve uma Bolsa de Criação Literária do Instituto Português do Livro e das Bibliotecas (Ministério da Cultura) para escrever o seu terceiro romance, Vício, e foi bolseiro da Fundação Oriente em Macau, onde esteve três meses, para escrever a sua quarta novela, O mal. Viveu em Istambul (1999-2003) e reside, desde 2005, no Brasil. [ler mais]
O escritor que perdeu a pátria
José Saramago atribuiu-lhe o primeiro prémio literário com o seu nome. Herberto Helder disse que ele era «o único jovem romancista português que conseguia ler». De escritor-promessa da geração de 1990 a persona non grata do meio literário português, eis Paulo José Miranda. Um ilustre desconhecido, agora a viver no Brasil.
Não há quem não conheça os nomes de José Luís Peixoto, Valter Hugo Mãe, Gonçalo M. Tavares ou João Tordo. Mas poucos, muito poucos, registaram, recordam ou conhecem o nome de Paulo José Miranda e da sua pequena obra-prima, Natureza Morta, que em 1999 foi distinguida com o primeiro prémio literário José Saramago. O que aconteceu então a este poeta e prosador que um dia foi considerado o maior valor da sua geração, o herdeiro de Saramago e Herberto Helder, que hoje não encontra editora para os seus livros? Treze anos depois de ter recebido o prémio com o nome do Nobel, Paulo José Miranda fala pela primeira vez à imprensa.
De dois em dois anos, no outono, quando Pilar del Río anuncia o Prémio Saramago, há sempre alguém que pergunta «o que é feito de Paulo José Miranda?», e há sempre alguém que responde: «Foi para a Turquia, gastou todo o dinheiro em vinhos caros e ficou por lá.» Como não há mais pormenores, a conversa morre aqui e a lenda compõe-se com os detalhes que a imaginação de cada um permite.
Porém, a realidade é outra, e se Paulo José Miranda (P.J.M.) está mais perto do que se supunha, a sua história é mais fascinante do que qualquer ficção que sobre ele se tenha inventado.
Naquele dia de outubro de 1999, P.J.M. estava com a namorada num festival de cinema no Sul da Turquia quando teve uma súbita vontade de conversar com a mãe, com quem não falava há sete meses. Como não tinha dinheiro andou a pedir moedas numa estação rodoviária para ligar de um telefone público. A mãe avisou logo que «andava muita gente atrás dele», mas que só o seu editor, André Jorge, da Cotovia, poderia explicar-lhe a razão. A conversa com a mãe acabou-lhe com as moedas e P.J.M. teve de voltar a apelar à simpatia dos outros viajantes para conseguir ligar de novo para Portugal.
«Está sentado?», perguntou-lhe André Jorge, antes de lhe contar que Saramago e Pilar del Río também andavam à procura dele para lhe anunciarem que tinha ganho a primeira edição do prémio literário. «Andavam todos à minha procura e eu no Sul da Turquia, incontactável durante meses», recorda Paulo numa voz grave mas acolhedora, com um subtil sotaque brasileiro, fruto dos sete anos que já leva de vida no Brasil.
«Compraram-me uma passagem para ir a Portugal receber o prémio. Fiquei poucos dias em Lisboa, conversei vagamente com Saramago. Falei mais com a Pilar. De resto, fazia um ano que ele tinha ganho o Nobel e era ele o centro das atenções. Ninguém me ligou nenhuma. Não dei uma entrevista sequer. Voltei para Istambul e a única diferença foi que trazia mais dinheiro.»
A forma como o escritor gastou o valor do prémio é sem dúvida menos superficial do que a traçada na lenda. [...] [dn.pt]